Investigação aponta uso de perfis falsos para influenciar eleições no Brasil

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Uma empresa baseada no Rio de Janeiro seria responsável por gerenciar diversos perfis falsos nas redes sociais, que seriam utilizados para manipular a opinião pública, especialmente durante as eleições de 2014. A informação foi divulgada por reportagem da BBC Brasil.

Essa estratégia de manipulação seria similar com aquela que os russos teriam feito durante as últimas eleições americanas e ela já existiria em nosso país desde os pleitos municipais de 2012. A reportagem da BBC entrevistou quatro pessoas que dizem ser ex-funcionárias dessa empresa. Elas teriam material com mais de 100 perfis falsos nas redes sociais e, pelo menos, 13 políticos teriam se beneficiado desse tipo de atividade, apesar da falta de evidências de que eles soubessem da existência desses perfis.

Uma equipe de pesquisadores da Universidade Federal do Espírito Santo disse que esse perfis podem ser chamados de “ciborgues”. Eles seriam uma evolução dos chamados “bots”, e se tratam de uma mistura das atividades entre pessoas reais e as máquinas, o que dificulta um rastreamento.

“Os ciborgues ou personas geram cortinas de fumaça, orientando discussões para determinados temas, atacando adversários políticos e criando rumores, com clima de ‘já ganhou’ ou ‘já perdeu'”, explicou o pesquisador Fábio Malini, coordenador do estudo.

Tudo teria começado quando o empresário e fundador dessa empresa carioca decidiu criar um exército de perfis falsos nas redes sociais e chegou a contratar 40 pessoas Brasil afora, justamente com o intuito de inflamar campanhas políticas.

Em entrevista, o empresário, que ficou conhecido por criar um perfil no Twitter que alertava motoristas a respeito de blitze de Lei Seca espalhadas pela cidade do Rio de Janeiro, negou todas as acusações. Ele disse que sua empresa apenas realiza monitoramentos e rastreamentos de redes sociais.

Mas não é o que um dos ex-funcionários afirma. Ele alegou ter sido contratado, imaginando que tomaria conta justamente da página sobre as Blitze de Lei Seca, mas logo se deparou com o trabalho de perfis falsos. Por conta disso, disse que precisou esconder de familiares e amigos assuntos relacionados ao seu trabalho e que chegou a trabalhar “para muita gente importante.”

Como o esquema funcionava

De acordo com os entrevistados, 13 políticos teriam se beneficiado desse serviço de perfis fakes, como os senadores Aécio Neves, Renan Calheiros e Eunício Oliveira, que é o atual presidente do Senado.

Como você já deve imaginar, a atuação variava de acordo com o que cada político necessitava. No caso de Aécio Neves, eram publicadas mensagens a seu favor durante a eleição presidencial de 2014. Para Renan, foi criada uma hashtag “#MexeuComRenanMexeuComigo” em 2013, época em que foi pedido o impeachment do então presidente do Senado.

Com relação a partidos políticos, a empresa carioca teria recebidos pagamentos de três e de um partido, em específico: o PSDB. Ela teria recebido 360 mil reais dos tucanos para “prestação de serviços de marketing e comunicação digital”.

O PMDB também seria um dos partidos que mais fez uso dos serviços da empresa. Tudo indica que Renan Filho (então candidato ao governo de Alagoas em 2014), Vital do Rêgo Filho (atual ministro do Tribunal de Contas da União, que era candidato ao governo da Paraíba em 2014) e a deputada federal Laura Carneiro, todos filiados ao partido, também contrataram a empresa para realizar o acompanhamento de suas redes sociais.

Membros de outros partidos, como o DEM, PSD e PSB também teriam contratado o serviço da empresa.

No entanto, não existem evidências que comprovem que os políticos e partidos beneficiados com esse esquema sequer sabiam da existência desses perfis falsos que agiam em seu favor.

Um outro detalhe do esquema é que os empregados vinham de diversas partes do país e eram constantemente monitorados por meio do Skype. A vigilância era tamanha que até mesmo para irem ao banheiro, precisavam avisar o coordenador.

Para executar o trabalho, eles já recebiam perfis prontos, chamados de “personas”: já recebiam nome, foto e a história das “pessoas” que tomariam conta, algo semelhante com o que é feito com marketing de conteúdo, para definir o perfil do público alvo, por exemplo.

Os empregados recebiam essa orientação justamente para evitar o levantamento de suspeitas. Assim, precisavam mesclar publicações corriqueiras, como coisas de rotina, com mensagens de apoio a determinado candidato. Os funcionários, que em muitos casos sequer tinham curso superior, chegavam a receber um salário entre 800 e 2 mil reais.

Para que nenhuma pessoa desconfiasse da farsa, a empresa chegou até mesmo a fornecer chips de celular para que os perfis falsos fossem autenticados também em redes sociais em smartphones.

E mesmo quando essa farsa era desmascarada, a empresa tinha uma carta na manga: o perfil era rapidamente desativado e substituído por outro, que faria a mesma função.

Os políticos, partidos e empresas que seriam beneficiados com esse “apoio”, em sua maioria, declararam não ter conhecimento a respeito desses perfis falsos e que condenaram esse tipo de prática.

Regulamentação

Conforme dito no início do texto, esse tipo de prática não é exclusivo do nosso país. Acredita-se que muitos perfis falsos e notícias falsas (as populares “fake news”) foram utilizados para tentar influênciar as eleições americanas do ano passado. O próprio Facebook teria desativado cerca de 470 contas e páginas, que seriam oriundas da Rússia e tratavam de assuntos como direitos raciais e LGBT e imigração.

Desta forma, já surgem diversas campanhas para tentar coibir esse tipo de prática. Um pessoa que apoia essa ideia é o professor Pablo Ortellado, da USP, que afirma que deve existir uma regulamentação maior das redes sociais e que deveriam começar a agir “como se fosse um Estado, já que virou o nova esfera pública”, principalmente por ser o novo palco de discussões e interações entre a população.

Em outras palavras, o professor diz que as próprias redes sociais precisarão fazer uma autorregulação em breve, se não quiserem ser reguladas pelos próprios Estados.

As duas principais redes sociais do mundo , o Facebook e o Twitter, afirmam que o uso de perfis falsos é uma violação de suas regras e políticas, o que pode resultar na suspensão da conta em questão. Inclusive, a rede social criada por Mark Zuckerberg garantiu que já está eliminando contas falsas da rede e que deve tomar as mesmas medidas para as eleições presidenciais de 2018.

E como identificar um perfil falso nas redes sociais?

De acordo com especialistas, existem diversas pistas que indicam se um perfil é falso ou não.  Algumas delas são:



  • Uso de fotos comprovadamente falsas, modificadas ou roubadas;
  • Publicação de mensagens por meio  de mesma ferramenta externas às redes sociais;
  • Repetição de palavras e um padrão utilizado para divulgação de mensagens;
  • Publicações feitas apenas durante horário comercial;
  • Participação em debates mais calorosos e os famosos “tuitaços”;
  • Mensagens corriqueiras de apoio a certos candidatos e de ataque a outros concorrentes.
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