Será que o dinheiro em espécie irá desaparecer um dia?

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Nesta terça-feira (27), o caixa eletrônico completa 50 anos de existência, e ele já foi descrito por Paul Volcker, ex-diretor do Banco Central dos EUA como a “única inovação bancária que se tornou útil”. Mas atualmente, o dinheiro em espécie que fica dentro deles pode ser tornar algo em extinção.

O dinheiro vivo está sendo deslocado de uma maneira na qual já está ficando de lado. Existem cartões de crédito e pagamentos eletrônicos, aplicativos como o PayPal e serviços de internet banking pelo celular, por exemplo. Tais inovações estão desenvolvendo comunidades cada vez mais independentes das notas de dinheiro.

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Assim, não é besteira imaginar que elas sigam o mesmo caminho de outras coisas que foram substituídas por alternativas digitais, como fotografia, música e filmes.

Mas isso pode levar um bom tempo para acontecer. Sim, o dinheiro em espécie está se tornando menos popular, por conta de seu alto custo e novas alternativas, como as que foram citadas acima. Mas deve permanecer conosco para sempre. O futuro será com “menos notas”, ao invés de “sem notas.”

O custo do dinheiro

No ano de 2013, acredita-se que aproximadamente 85% das transações mundiais envolveram dinheiro vivo.

Enquanto que Cingapura, Holanda, França, Suécia e Suiça estão entre os países menos dependentes de dinheiro em espécie, Malásia, Arábia Saudita, Peru e Egito fazem apenas 1% de suas transações sem notas de dinheiro. Até mesmo países desenvolvidos, como o Japão, ainda são bem dependentes do dinheiro vivo.

Já o uso das notas nos EUA ainda é relativamente alto, se comparado com os países europeus. Em 2015, o dinheiro em espécie representou 13,1% de seu Produto Interno Bruto (PIB), em comparação com os 7,1% e 4,5% de França e Suiça, respectivamente.

Preocupações com a igualdade social oferecem uma motivação para a diminuição de alternativas sem notas. Nos Estados Unidos, por exemplo, o uso de dinheiro em espécie impõe altos tributos em seus consumidores, e o impacto é ainda maior em pessoas que não possuem contas em bancos.

Os “sem banco”, por exemplo, chegam a pagar até quatro vezes mais taxas para acessar seu dinheiro do que aqueles que possuem contas bancárias.

Consumidores mais pobres também gastam mais tempo para conseguir dinheiro. Em média, os americanos gastam 28 minutos por mês viajando para conseguir dinheiro, mas esse tempo não é bem distribuído. Pessoas que não vão a bancos gastam cinco minutos a mais do que isso, e aqueles que estão desempregados perdem até nove.

Mas existem muitos estudiosos que acreditam que existem benefícios para uma sociedade com “menos dinheiro em espécie”. Ken Rogoff, da Universidade de Harvard, diz que eliminar notas com altos valores é uma forma de evitar que ele seja utilizado para bancar atividades ilegais.

Um mundo sem notas de dinheiro

Uma combinação de iniciativas públicas e privadas está procurando uma forma de acabar com a predominância global do dinheiro vivo, com alguns países bem a frente dos demais.

A Suécia, por exemplo, está perto de se tornar a primeira nação mundial sem qualquer tipo de dinheiro em espécie. Desde a década de 60, o país procura alternativas para esse tipo de pagamento, e os cartões de crédito se tornaram altamente populares de 1990 pra cá.

Já existe um aplicativo, chamado de Swish, criado por bancos suecos, que é utilizado por metade da população, e realiza transferências por meio de moeda digital. Muitos negócios desencorajam o uso de notas, e alguns deles são até mesmo autorizados a recusar pagamentos dessa espécie.

Já em outras nações, governos estão experimentando novas formas inovadoras de pagamentos digitais. Em 2012, a instituição que produz as moedas do Canadá lançou o projeto MintChip, que foi repassado para a iniciativa privada. O plano é guardar dinheiro em chips de computador e permitir transferências bancárias entre dois chips por meio de mensagens criptografadas.

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A iniciativa privada está desenvolvendo sociedades desse tipo até mesmo em lugares que jamais imaginamos. A Somalilândia, república que declarou sua independência da Somália, está à frente com um sistema de pagamento por celular, chamado de ZAAD.

Talvez a mudança mais significativa tenha ocorrido na índia. Em novembro do ano passado, o governo indiano tomou a arriscada decisão de desmonetizar as notas de 500 e 1000 rupias, o que afetou 86% do dinheiro em espécie em circulação. O objetivo era conseguir frear a corrupção e atividades ilegais bancadas com esse tipo de pagamento.

Novas notas de 500 e 2000 rupias foram lançadas, então a população precisou ir até os bancos para trocar seu dinheiro, que agora estava desmonetizado.

Em um país em que quase 90% das transações acontecem dessa forma, tal decisão interrompeu a produção de diversas empresas, remunerações não foram pagas e criou imensas filas em bancos. Quem ganhou com isso foram os serviços bancários de celular. O Paytm, o mais famoso da Índia, registrou um aumento de tráfego de 435% durante esse período, por exemplo.

Ainda assim, a nação é, de fato, um país dependente do dinheiro em espécie. Cinco meses após esse processo, a retirada de dinheiro vivo era 0,6% maior do que no mesmo período do ano anterior.

O futuro do dinheiro em espécie

O que explica, então, a dependência de dinheiro em espécie, apesar de seus custos e várias alternativas que já existem?

O dinheiro vivo é único entre os métodos de pagamento existentes, pois qualquer um pode fazer transações em qualquer hora ou lugar, sem o envolvimento de uma terceira pessoa. Com tal liberdade, vem a privacidade. As notas de dinheiro não sabem ou se importam com quem esteja as carregando ou quando uma transação ocorreu. Assim, as pessoas tem um senso de segurança maior.

Tudo isso pode evoluir enquanto nossas sociedades se tornam cada vez mais digitais. Mas velhos hábitos e percepções podem levar muito tempo para serem mudados. Muitos comerciantes podem mostrar resistência aos custos de novos equipamentos ou taxas que acompanham as novas alternativas. O dinheiro vivo pode ser considerado mais conveniente e versátil, enquanto que nas transações digitais, existem sempre preocupações com ataques cibernéticos e fraudes.

Assim, vamos celebrar os 50 anos do caixa eletrônico, independente de onde você esteja. A conexão entre o ser humano e o dinheiro em espécie é algo que pode levar muito tempo para ser quebrada. Por mais que esteja menos popular, pode ter certeza que sempre haverá alguém te perguntando onde que fica o caixa mais próximo.

Descontos no Brasil

Para mostrar como que o dinheiro vivo ainda pode ser muito útil para nós, vamos pegar um exemplo dentro do nosso próprio país.

No final do ano passado, o Presidente Michel Temer autorizou, por meio da Medida Provisória 764, que lojistas cobrem preços diferentes em um mesmo produto, dependendo da forma de pagamento.

Essa MP, na prática, autoriza que sejam aplicados descontos para pagamentos à vista ou feitas com dinheiro em espécie. Antes, tal prática era proibida. Na época, o Ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, afirmou que o objetivo era estimular a competição entre os métodos de pagamento, reduzir os juros do cartão de crédito e regularizar uma prática que já é existente nos pequenos comércios.

Texto adaptado do artigo de Bhaskar Chakravorti, para o site The Conversation

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