Fazem exatamente 80 anos que o físico teórico Ettore Majorana previu que haviam partículas carregadas de forma neutra que eram indistinguíveis da sua própria antipartícula. Nenhuma dessas partículas tinha sido encontrada na natureza, e não foi por falta de olhar.
Os físicos agora encontraram a segunda melhor opção de algo parecido: um sistema semelhante a partículas que se comporta exatamente como o tipo de matéria que Majorana previu. Não só fornece provas experimentais desses tipos únicos de partículas, mas pode ter aplicações no futuro da computação quântica.
Pesquisadores de Stanford e da Universidade da Califórnia fizeram a descoberta forçando os elétrons a fluírem em direções opostas ao longo das bordas de um sanduíche de materiais supracondutivos, para gerar coletivamente pares do que são conhecidos como quasipartículas.
Não deixe o fato de que as quasipartículas não são são literalmente partículas acabem te enganando, porque elas ainda contam como evidências de certos fenômenos.
A aplicação de um campo magnético a esses casais parecidos com partículas, quando elas se fecharam, causou que eles diminuíssem e mudassem de direção em estágios distintos, uma característica que foi explorada para detectar um tipo de comportamento que era uma assinatura das partículas de Majorana.
“Nossa equipe previu exatamente onde poderíamos encontrar o férmion de Majorana e o que procurar como sua assinatura experimental”, disse o pesquisador de Stanford, Shoucheng Zhang.
Em homenagem, eles chamaram suas descobertas de “partículas de anjo”, depois do thriller Dan Brown, Anjos e Demônios, que possui uma bomba feita de antimatéria.
Em termos simples, para todo tipo de partículas fundamentais no Universo existe o equivalente a um gêmeo “maligno” com uma carga oposta, o elétron com carga negativa, por exemplo, possui um pósitron carregado positivamente como sua antipartícula.
Trazer as duas partículas juntas faz com que elas anulem, não deixando nada para trás nada além de uma emissão intensa de radiação gama. É essa enorme pilha de radiações que serviu de combustível imaginário para todos os tipos de motores espaciais futuristas e armas hipotéticas de destruição em massa.
As partículas e as antipartículas também podem ir ao contrário, nascendo juntas em uma concentração de energia, como as que estão dentro de colisões de partículas, que é como os físicos as estudam hoje.
Majorana descobriu que deve haver partículas que são suas próprias antipartículas dentro da classe fundamental de matéria conhecida como férmions, que inclui coisas como elétrons, neutrinos e os quarks que compõem prótons e nêutrons.
Essas partículas de Majorana também podem ser criadas como um par, mas seriam idênticas e não se destruiriam se fossem colocadas juntas novamente. Os fótons são bons exemplos de entidades que são também as suas próprias antipartículas, mas não são férmions.
Neutrons, por outro lado, seriam excelentes candidatos, já que eles já são neutros. Infelizmente, se os nêutrons forem reunidos com anti-neutrons, seu grupo oposto de quarks ainda se aniquila.
Outro candidato interessante são os pequenos e quase sem massa, chamados de neutrinos. Dada a dificuldade em detectar essas partículas fantasmagóricas, ainda é difícil dizer se eles se qualificam como férmions de Majorana.
Poderíamos concluir que tais partículas simplesmente não existem no Universo, pelo menos não fora de experiências como essas. Isso não quer dizer que esses resultados não têm nada para contribuir com a busca de partículas reais de “Majorana”.
“Onde fica mais interessante é que as analogias na física se mostraram muito poderosas. E mesmo que sejam bestas muito diferentes, processos diferentes, talvez possamos usar um para entender o outro. Talvez possamos descobrir algo que também é interessante para nós”, disse o pesquisador Giorgio Gratta, também de Stanford.
Mesmo que os resultados não sejam chocantes, a engenharia do próprio experimento tem sido de interesse para os físicos.
A tecnologia poderia ser usada no futuro como forma de reduzir o risco de uma partícula em um computador quântico perder a informação. Um anti-partícula de backup pode ser usada como algo que torna o sistema mais robusto.
O premiado do Nobel, Frank Wilczek, que não estava envolvido na pesquisa, elogiou a engenhosidade da equipe.
“Não é fundamentalmente surpreendente, porque os físicos pensaram há muito tempo que os férmions de Majorana poderiam surgir dos tipos de materiais utilizados neste experimento”, diz Wilczek.
“Mas eles reuniram vários elementos que nunca antes foram reunidos, e realizaram um processo de engenharia permitindo que esse novo tipo de partícula quântica pudesse ser observada de maneira limpa e robusta, isso é um marco real”.