Nós, humanos, somos criaturas visuais. E aqueles que possuem uma visão normal acreditam que nossos olhos são vitais na forma de viver nossas experiências no mundo, bem como a necessidade de uma fonte de luz.
A visão é uma forma avançada de fotorrecepção, em outras palavras, sensibilidade à luz. Mas nós também vivenciamos outras formas rudimentares de fotorrecepção em nossas vidas. Por exemplo, sentimos quando o sol começa a queimar nossa pele, e nesse caso, utilizando o calor como substituto da luz. O olhos e nem mesmo fotorreceptores especiais são necessários.
Mas cientistas descobriram, em décadas recentes, que muitos animais – incluindo os seres humanos – possuem moléculas especias para detectar a luz em lugares inesperados, que ficam fora dos olhos. Esses “fotorreceptores extraoculares” são geralmente encontrados no sistema nervoso central ou na pele, mas também são frequentes em órgãos internos. O que elas estariam fazendo em locais além dos olhos?
A visão depende de como detectamos a luz
Todas as células visuais identificadas em animais detectam a luz utilizando uma família simples de proteínas, chamada de opsina. Essas proteínas pegam a molécula sensível à luz – que é derivada da vitamina A – que modifica sua estrutura quando exposta à luz. A opsina modifica sua própria forma e cria um sinal nas células fotorreceptoras que enviam uma mensagem para o cérebro de que a luz foi detectada.
A maior parte de nossa visão é gerada a partir de fotorreceptores na retina, a camada sensível à luz que fica no fundo de nossos olhos. Nos animais vertebrados, as células que detectam a luz para a visão possuem um formato de cone.
Sabemos, há algum tempo, que outras espécies de vertebrados possuem fotorreceptores adicionais em seus cérebros. Mas cientistas pensaram, por muito tempo, que esses cones eram voltados, principalmente, para os mamíferos.. Assim, a descoberta, no início dos anos 2000, de que outras células na retina de ratos também respondiam à luz foi um verdadeiro choque.
Essas descoberta descobriu uma nova classe de opsinas, chamada de melanopsina, que não havia sido identificada em vertebrados (e que era semelhante com a de invertebrados). Ela não parece estar envolvida com nossa visão consciente.
Nós, inclusive, não podemos chamá-las de extraoculares, já que elas estão presentes nos olhos. Ao invés disso, são denominadas como fotorreceptores “não-visuais”. Esse é o termo que pesquisadores utilizam para todos os fotorreceptores animais que não estão associados com a formação de imagens a partir do sistema nervoso.
Já que agora sabemos que existem fotorreceptores não-visuais em quase todos os animais, o que mais podemos encontrar pelo nosso corpo?
A caça por fotorreceptores longe dos olhos
No geral, identificar um potencial fotorreceptor extraocular significa procurar por proteínas que podem detectar luz, no caso, as opsinas. O advento de eficientes e baratas tecnologias genéticas moleculares transformaram a procura pela opsina em algo mais fácil e comum em laboratórios pelo mundo todo.
As células que contém as opsinas são, provavelmente, fotorreceptores ativos, mas pesquisadores utilizam testes fisiológicos ou comportamentais para confirmar isso. Por exemplo, eles podem procurar por mudanças elétricas ou modificações na atividade de um animal quando suas células estão em contato com a luz.
Os fotorreceptores que cientistas encontraram além dos olhos são normalmente encontrados no sistema nervoso central. Quase todos os animais possuem diversos tipos de cérebros e nervos, por exemplo.
A pele é o local onde é possível encontrar mais receptores de luz, particularmente em células ativas que podem modificar suas cores, como os cromatóforos, encontrados em diversos peixes, crangueijos e sapos. Elas atingiram o ápice de seu desenvolvimento nos cefalópodes: polvos e lulas, por exemplo. Esses animais consegue controlar suas cores para se camuflar de predadores, intimidar ou atrair um(a) companheiro(a).
Surpreendentemente, existe uma segunda classe de moléculas sensíveis à luz além das opsinas, que jamais foram utilizadas para a visão (até onde sabemos). Elas estão presentes em algumas estruturas nervosas, como nas antenas de alguns insetos e até mesmo na retina de pássaros. Esses são os criptocromos, e suas funções exatas e métodos de ação ainda são muito vagos. Os criptocromos foram descobertos, originalmente, em plantas, e são responsáveis em auxiliar no crescimento e mudanças reprodutivas anuais.
Por que detectar a luz além dos olhos?
Agora que nós sabemos que os fotorreceptores podem ser encontrados pelo corpo de diversos animais, qual é o exato papel deles? Obviamente, depende de onde que estão localizados.
Geralmente, eles são responsáveis por regular os níveis de luz que estão além de nossa consciência, que não necessita de uma fonte de luz no espaço ou no tempo. Funções normais incluem ligar o nosso alerta sobre o ciclo do dia, o horário de dormir e acordar, nosso humor, temperatura corporal e outros ciclos internos que precisam estar sincronizados com as mudanças do dia e da noite.
Os relógios biológicos que mantém nosso ciclo fisiológico são praticamente controlados por esses fotorreceptores. Eles também são importantes no momento de regular a abertura da pupila para ajustar às variações dos níveis de luz. No caso dos peixes ou polvos, eles também ajudam a controlar as cores e seus formatos.
Em outros animais, eles possuem uma tarefa diferente e incrível: a habilidade de detectar o campo magnético da Terra. Ela é responsabilidade dos criptocromos, que, aparentemente, possuem mecanismos para auxiliar na orientação magnética de pássaros e baratas.
Nós também possuímos habilidade fotorreceptoras não-visuais
Com a descoberta de células da retina sensíveis à luz, em adição ao formato de cones das retinas dos mamíferos, se tornou óbvio que os humanos também utilizam caminhos não visuais para controlar nosso comportamento e funções.
O tamanho da pupila varia com relação a quantidade de luz, até mesmo nos humanos que são deficientes visuais. Um estudo realizado em conjunto pelos EUA e Reino Unido, publicado em 2007, mostrou que pacientes que perderam os cones dos olhos por conta de desordens genéticas ainda podem responder à sensibilidade de luz, por meio do ritmo diário e das pupilas. Houve um paciente que chegou a dizer que já teve a sensação de luminosidade quando viu uma luz azul, que é capaz de estimular os outros fotorreceptores da retina.
Pesquisas recentes com roedores na Universide John Hopkins sugerem que os caminhos não visuais são capazes de regular o humor, nossas habilidades de aprendizado e até mesmo a sensibilidade de nossa visão consciente.
Finalmente, uma recente e inesperada descoberta, também feita na Universidade John Hopkins, descobriu que vasos sanguíneos de ratos possuem a melanopsina. Os cientistas responsáveis observaram que a proteína é capaz de regular a contração e relaxamento dos próprios vasos sanguíneos. Como os humanos também devem ter o mesmo sistema, isso pode explicar, parcialmente, o aumento de ataques cardíacos pela manhã, que são, provavelmente, associados com as mudanças na pressão sanguínea que ocorrem nesse momento.
Mais pesquisas devem mostram quais são os efeitos exatos dos fotorreceptores na saúde humana e em nosso bem estar.
Fonte: Scientific American