Imagine um mundo sem doenças infecciosas, como HIV, malária, tuberculose, gripe e assim por diante até a ausência do resfriado comum. Seria sensacional, certo?
A erradicação de doenças infecciosas certamente parece ser o objetivo final da investigação médica. Mas e se nós realmente chegássemos lá? O site Livescience entrevistou médicos especialistas e tentou fazer uma projeção.
“Se tivéssemos uma pílula mágica que nos livrasse de todas as doenças infecciosas, nós realmente usaríamos?”, questiona o epidemiologista Nim Arinaminpathy, da Universidade de Princeton. Ele não tem certeza. Nem nós.
Erradicar a humanidade de doenças infecciosas não seria uma eventualidade universalmente positiva, mas não provocaria a queda imediata dos seres humanos.
Sobrevivência dos menos adaptados
“Nossa história evolutiva tem sido uma corrida armamentista contínua contra os agentes patogênicos que nos afligem”, disse Vincent Racaniello, professor de microbiologia e imunologia na Universidade de Columbia.
Por eras, essa corrida eliminou os mais fracos. Em um ambiente menos combativo, sem doenças, as normas para a sobrevivência humana ficariam mais frouxas.
No entanto, isso não é tão problemático como pode parecer. “Em grande parte do Ocidente, as pessoas já são como animais artificiais”, disse Racaniello. “Nós temos formas de intervir quando as pessoas ficam doentes, quando de outra forma teriam morrido”, afirmou.
Muitas doenças já poderiam ter sido erradicadas em todo o mundo, sem perder a robustez evolutiva. “Não há qualquer indicação de que a gripe desempenha um papel na evolução humana”, disse Arinaminpathy.
Um agente patogênico só pode afetar o DNA humano se ele mata muitas pessoas antes de terem filhos. Caso contrário, suas vítimas já passaram seus genes para a próxima geração, independentemente de esses genes sejam suscetíveis ao patógeno ou não. A gripe é mais fatal para os idosos, que normalmente já passaram seus genes.
Por outro lado, a malária tem como alvo os jovens, e, portanto, molda a evolução das pessoas em muitos países tropicais, matando crianças com baixa imunidade. Mas essa “sobrevivência do mais apto” não é desejável.
A malária tem sido praticamente erradicada nos Estados Unidos sem desvantagens óbvias. Se isso também acontecer na África e em outras regiões atingidas, “o impacto da redução ou remoção de malária iria além da saúde pública”, disse Arinaminpathy.
Sem doenças = população saudável
O parasita da malária atua de forma desenfreada na África. Crianças são atingidas mais e mais em um ciclo quase contínuo.
“Você não pode pensar de forma clara, se sente terrível e isso o impede de ir para a escola ou ter uma vida produtiva”, disse Racaniello.
Enquanto isso, o HIV está age na África sub-saariana da mesma forma no desenvolvimento e produtividade. Resumindo: doenças avançam em situação de pobreza.
“Se você se livrar de doenças infecciosas por meio da vacinação, é possível fazer uma grande contribuição, levando as pessoas a saírem da pobreza para que possam ter uma vida produtiva”, disse Racaniello.
Acabar com malária, tuberculose, HIV e outras pragas tropicais significaria crescimento populacional em áreas que já experimentam taxas de natalidade altas e crises alimentares. Porém, esses problemas socioeconômicos seriam muito mais suaves em uma sociedade livre de doença.
Erradicar doenças infecciosas iria beneficiar a humanidade, em termos globais. Mas há ainda uma outra questão.
Bons resfriados?
Ficar gripado ou resfriado quando jovem nos ajuda na fase adulta/velhice? Sim!
De algum jeito, esses vírus ajudam no crescimento e desenvolvimento do nosso metabolismo, ou até mesmo dos nossos órgãos. Os cientistas não têm certeza, porque eles não tiveram a oportunidade de estudar uma população humana livre de vírus, como fizeram com população livre de bactérias ou parasitas. Mas tudo indica que funciona dessa forma.
“Estamos começando a aprender que a consequência de antibióticos é que quando você se livrar das bactérias boas em nossas entranhas, podemos desenvolver doenças auto-imunes, como alergias. Não estamos tão avançados em nossa compreensão do vírus. O que o vírus faz em nós?”, disse Racaniello.
Alguns dos vírus benignos que pegam uma carona em nossos corpos poderiam estar ajudando de forma mais profunda do que imaginamos, segundo Arinaminpathy. Nossas relações com os vírus são “um pouco confusas”, de acordo com o médico.
Devemos ter cuidado com o que desejamos. Arinaminpathy destaca que livrar o mundo de doenças seria “uma coisa boa, mas existem essas questões interessantes quando você arranha a superfície destas doenças”.