O desejo da Coreia do Norte de ter suas armas nucleares, que ganhou contornos dramáticos com o teste do último final de semana e o míssil de longo alcance que sobrevoou o Japão, é condenado, universalmente, por ser uma grave ameaça a paz e segurança internacional.
Só que o aumento das ameaças da Coreia do Norte é um reflexo da falha crônica de esforços multilaterais de contra proliferação de armas nucleares. Em particular, com a conhecida refusa de Estados Unidos e Reino Unido em reduzir e, eventualmente, eliminar seus arsenais nucleares.
Em outras palavras, os líderes do passado e presente de Estados Unidos, Rússia, China, França e Reino Unido, cujos governos assinaram, mas não cumpriram, os termos do Tratado de Não Proliferação de Armas Nucleares, em 1970, possuem parte da culpa das ambições norte coreanas. A imprudência de Kim Jong-Un é fruto dessas ações.
Esse tratado, assinado por 191 países, é, provavelmente, o mais bem sucedido tratado de controle de armas da história. Quando foi concebido, em 1968, no auge da Guerra Fria, a proliferação em massa de armas nucleares era uma possibilidade real. Desde a sua implementação e antes da Coreia do Norte, apenas Índia, Paquistão e Israel se juntaram ao clube de países que possuem armamentos dessa natureza, em quase metade de um século.
Para que funcione completamente, o tratado possui dois pontos fundamentais: Estados que não possuem armas nucleares concordaram em jamais comprá-las ou adquirí-las, enquanto que os países que as possuem devem compartilhar os benefícios pacíficos da tecnologia nuclear e, um dia, eliminar esse tipo de armamento. Mas sabemos que esses acordos jamais foram cumpridos totalmente.
Ao invés de reduzir seus arsenais nucleares, Estados Unidos, Rússia e China promoveram sua modernização e expansão. O Reino Unido eliminou parte dele, mas também se modernizou, enquanto que a França também pouco fez nesse meio tempo. No total, os Estados nucleares possuem 22 mil bombas dessa natureza.
“A necessidade de desarmamento nuclear, através da diplomacia multilateral, nunca foi tão grande desde o final da Guerra Fria. A confiança e confidência no existente tratado de não proliferação nuclear está desgastada, as tensões estão altas, os objetivos estão desalinhados e o diálogo está irregular”, afirmou um relatório do Conselho de Informação de Segurança Americano-Britânico, que não faz parte de nenhum governo.
Enquanto a Coreia do Sul e o Japão estão considerando a ideia de conseguirem armas nucleares, Donald Trump, de forma irracional, está determinado a acabar com um dos poucos controles de armas recentes que deram certo – o acordo nuclear feito com o Irã, em 2015.
Houve um momento muito importante em 2017, no qual 122 países adotaram, no último mês de julho, um novo acordo de proibição de armas nucleares, que tem com objetivo banir o uso de qualquer armamento nuclear. Mas ele já sofreu um boicote das forças nucleares. Estados Unidos, Reino Unido e França afirmaram, em tom cínico, que preferem continuar com o falho tratado de 1970 do que aderir ao desarmamento. “Essa iniciativa, claramente, não leva em conta as realidades do ambiente de segurança internacional”, disseram os três países, em um comunicado.
A ineficácia do atual controle de armas e dos esforços de não proliferação ajudaram a criar um cenário no qual a Coreia do Norte (mesmo utilizando motores de mísseis contrabandeados da Rússia) está rapidamente melhorando o seu programa nuclear, com aparente impunidade e trazendo um grande risco para a estabilidade internacional.
Essa falha no controle de armamentos nucleares também significa que a solução apontada por Donald Trump – uma ação militar na Coreia do Norte – pode dar início a uma nova corrida nuclear, por debaixo dos panos.