Combustão humana espontânea: corpos podem queimar sem razão aparente?

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Você provavelmente já escutou a seguinte história: uma pessoa, como qualquer outra, vai para a cama dormir. Durante o sono, ela pega fogo e seu corpo é reduzido a cinzas. Os investigadores não conseguem encontrar nada inflamável no local. E o mais estranho é que os objetos no entorno da vítima não sofreram nada. Esse fenômeno ganhou o nome de combustão humana espontânea.

Há séculos que a combustão humana espontânea é discutida por investigadores paranormais e cientistas, mas será que ela realmente existe? Como qualquer fenômeno paranormal, existe um imenso número de explicações, sendo que algumas são mais aceitas e outras não passam de mera especulação.

Independente se você acredita ou não no fenômeno, confira abaixo 10 fatos sobre a combustão humana espontânea:

Uma tradição antiga

Se você acha que o fato de pessoas pegarem fogo inesperadamente é um fenômeno recente, está muito enganado. O primeiro relato de uma combustão humana espontânea data de 1470, já no final da Idade Média. Um cavaleiro italiano, chamado de Polonus Vorstius, decidiu tomar algumas taças de vinho para relaxar, mas não saiu como planejava. Primeiro, ele teria começado a arrotar fogo, e depois começou a, literalmente, pegar fogo e ser queimado vivo, tudo isso na frente de seus pais.

Mas o que aconteceu com Polonus Vorstius só foi ser registrado na literatura em 1641, no livro de um médico dinamarquês chamado Thomas Bartholin, no qual catalogava estranhos casos médicos que aconteceram na história. Bartholin afirmou que escutou a história a partir de descendentes da família Vorstius, mas como já haviam se passado quase 200 anos, é bem possível que a história não seja verdadeira ou, no mínimo, teve alguns pontos inventados ou exagerados.

Sintomas oficiais

Parte do mistério que está por trás da combustão humana espontânea tem como base o simples fato de que é necessária uma grande quantidade de energia para queimar um corpo. De acordo com especialistas, é preciso uma temperatura entre 760 e 982 graus para cremar um ser humano, o que é, obviamente, muito maior que o calor gerado por um fósforo, vela ou cigarro.

E segundo alguns estudos publicados recentemente, os casos suspeitos de combustão humana espontânea costumam reduzir o corpo de suas vítimas a cinzas (apesar de que as mãos e os pés costumam ficar intactos).

Também existem certas similaridades entre os casos de combustão humana espontânea. As vítimas já costumam ser pessoas de idade, principalmente do sexo feminino, geralmente estão acima do peso e são alcoólatras. Suas cinzas são muito gordurosas e possuem um odor muito forte. E o que faz com que o fenômeno seja considerado apenas uma lenda urbana, por alguns, é que ninguém nunca viu qualquer vítima pegando fogo, o que coloca em xeque a existência da combustão humana espontânea.

A explicação da vela humana

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Apesar de a combustão humana espontânea ser uma resposta convincente para esses acidentes, outra teoria também é muito aceita: um fenômeno chamado de “efeito pavio.”

Segundo essa teoria, o corpo humano costuma agir como uma espécie de vela, enquanto que as nossas roupas seriam o pavio. Conforma as vestimentas queimam, o fogo entraria em nossa pele e começaria a derreter a gordura, que se transformaria em outra fonte que mantém o fogo queimando e cria um calor extra. Se você gosta de fazer um churrasco, sabe muito bem do que estamos falando.

Isso explicaria por que as mãos e os pés costumam ficar intactos (já que eles costumam não acumular gordura) e por que o fenômeno costuma acontecer com pessoas que estão acima do peso.

Ou é algo ainda mais estranho

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O efeito pavio pode até explicar alguns dos casos de combustão humana espontânea, mas existem exceções. Como ocorre com qualquer coisa paranormal, existe um número infinito de teorias alternativas.

Algumas podem até ser aceitas. O pesquisador Brian J. Ford afirma que o fenômeno é culpa da cetose, que é um estado de metabolismo que ocorre na ausência de glicose, e uma consequência é o aumento nos níveis de acetona do corpo. A acetona é inflamável, então a cetose – que é um sintoma comum do alcoolismo e de dietas com baixa quantidade de carboidratos – faz com a que pessoa seja mais propensa a pegar fogo. Enquanto isso, uma rara alergia a medicamentos, chamada de Síndrome de Steven-Johnson costuma deixar bolhas na pele de suas vítimas, que parecem muito com queimaduras, mas nem chegam perto de reduzir o corpo humano a cinzas.

Outras teorias já não são muito bem aceitas. Um cientista já afirmou que a culpa é do raio globular, um fenômeno elétrico ainda sem explicação. Já pesquisadores paranormais acreditam que a combustão humana espontânea pode ter relação com poltergeists, que costumam ser considerados responsáveis por colocar objetos inanimados em chamas. E em um livro publicado em 1995, o autor Larry E. Arnold – que não possuía nenhum embasamento científico – lançou a hipótese de partículas subatômicas chamadas de “pyrotrons”, que poderiam fazer uma pessoa pegar fogo se elas estivessem sob estresse.

Preocupação literária

Retratos do autor Charles Dickens
Retratos do autor Charles Dickens

Independente se a combustão humana espontânea é real ou não – e tudo indica que não passa de uma lenda urbana – ela se tornou motivo de preocupação de leitores, no século XIX, graças a uma pessoa: Charles Dickens.

Em dezembro de 1852, em seu livro A Casa Soturna, Dickens eliminou um personagem alcoólatra da obra justamente por meio da combustão humana espontânea. Chamado de Sr. Krook, ele também foi reduzido a chamas, enquanto que seu apartamento ficou intacto, com a exceção de gordura nas janelas e um cheiro putrefato.

Na época, o público considerava Dickens um autor realista, e após citar o fenômeno na obra, muitas pessoas acreditaram ser verdade, pois o escritor já havia utilizado doenças como varíola, tuberculose e apneia do sono em seus demais livros.

Mas, claro, alguns estudiosos, incluindo George Lewes, amigo próximo de Dickens, refutaram o que foi descrito em A Casa Soturna, afirmando se tratar de uma “impossibilidade científica”. Dickens se defendeu e disse citou o fenômeno após saber de diversos casos de combustão humana e por conta de descobertas recentes – como o oxigênio, crucial para o nosso corpo e para as chamas – para sustentar o que foi escrito.

O caso mais famoso

Foto de Mary Reeser e seus restos mortais Fonte: Reddit
Foto de Mary Reeser e seus restos mortais Fonte: Reddit

O caso mais famoso de combustão humana espontânea ocorreu em 1951, quando uma viúva de 67 anos, chamada Mary Reeser, morreu após um misterioso e desconhecido fogo que atingiu seu apartamento na cidade de São Petersburgo, no estado da Flórida, nos EUA.

O caso de Reeser se encaixa com tudo o que é necessário para causar a combustão humana espontânea. Ela era uma mulher robusta (pesava 77 kg, mais ou menos), que queimou até se tornar cinzas, junto de sua poltrona. Apenas os seus pés ficaram intactos. O teto do local ficou coberto de fuligem, mas os demais móveis e paredes estavam intactos. Um detetive afirmou que não encontrou indícios de matérias inflamáveis. Por conta disso, o caso ficou famoso nos Estados Unidos.

Mas também existe uma explicação para a morte de Reeser. Em 2009, o repórter Jerry Blizin decidiu investigar o caso e apresentou alguns detalhes importantes. Foi a própria gordura do corpo de Reeser que causou o incêndio. Na noite em que morreu, ela disse para seu filho que deixou de jantar para tomar dois comprimidos para dormir. Ele a viu pela última vez na poltrona em que morreu, fumando um cigarro. Apesar de ninguém saber o que aconteceu exatamente com a idosa, essa é uma explicação mais aceita, que não envolve nada de sobrenatural.

Impunidade

O fenômeno pode não ser real, mas possui sérias consequências, incluindo um caso em que um homem, acusado de assassinato, conseguiu ficar longe da cadeia.

O caso de Nicole Millet é um dos primeiros registros de combustão humana espontânea na literatura. Em 1725, um homem, chamado de Jean Millet, foi para sua cama, enquanto que sua esposa – que era alcoólatra – estava na cozinha, dizendo que não conseguia dormir. Por volta das duas da manhã, um cheiro estranho acordou Millet. Ele correu para a cozinha e viu os restos de sua esposa espalhados pela cozinha. Apenas seu crânio e alguns ossos ficaram intactos. O chão abaixo da mulher estava queimado, mas os demais objetos estavam em perfeito estado.

Millet foi preso por assassinato e chegou a receber uma sentença de morte, até que um médico chamado Claude Nicolas Le Cat interveio. Ele disse que estava no hotel que o casal era dono quando Nicole encontrou seu fim, e conseguiu convencer a corte de que se tratava de um caso de combustão humana. Assim, consideraram um “ato de Deus” e Jean Millet foi inocentado.

Mesmo assim, o fato de chegar a ser condenado arruinou a reputação de Millet e a sua saúde, e ele morreu algum tempo depois.

Combustível para discussões

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Se você ainda não percebeu, o álcool possui um papel importante na combustão humana espontânea. E nem é difícil entender o porquê disso. Além de te deixar embriagado e fazer com que você não saiba manusear um fósforo ou isqueiro, grandes quantidades de álcool te fazem dormir ou até mesmo desmaiar.

De fato, a ligação entre o álcool e a combustão humana espontânea é tão bem documentada que nos séculos XVIII e XIX, médicos e cientistas consideravam o álcool uma das causas primárias do fenômeno. Segundo os especialistas da época, o álcool se transformava em uma espécie de gás inflamável no corpo, causando a combustão.

Em 1799, um médico chegou a citar as bebidas alcoólicas que tinham mais propensão para causar o fenômeno: o gim era considerado o pior, seguido pelo conhaque, uísque e o rum.

Por conta disso, pessoas que eram contra o uso de bebidas alcoólicas utilizaram esse fato para dar suporte a sua causa. Durante o século XIX, quem defendia a proibição do álcool costumava citar o fenômeno como exemplo. E acredita-se que essa discussão chegou a se estender até a década de 20 do século passado.

O único sobrevivente

Além das chamas, há outra característica comum em todos os casos de combustão humana espontânea: eles são fatais. Tudo mudou em 1974, quando um vendedor viajante chamado Jack Angel afirmou ter sobrevivido ao fenômeno.

Conforme reportado por Larry E. Arnold (o cara dos pyrotrons), Angel acordou com uma queimadura em sua mão que era tão grave que ela precisou ser amputada. Além disso, ele encontrou buracos no seu peito e diversas queimaduras em suas virilhas, costas e pernas. Mas suas roupas, no entanto, estavam intactas, bem como o trailer em que viajava. Ainda segundo o autor, um médico disse para Angel que o fogo teve início no interior de seu corpo, e desde então ele seria o único caso de pessoa que sobreviveu a uma combustão humana espontânea.

Só que Joe Nickell, um dos poucos pesquisadores paranormais dos EUA, refutou toda a história, dizendo que não passava de uma espécie de trote e uma história inventada por Angel.

Segundo o pesquisador, Angel, na verdade, se queimou após tentar fazer alguns ajustes no aquecedor de água de seu trailer, que jogou um jato de água muito quente em seu corpo e causou as queimaduras. Angel teria processado a fabricante do trailer, mas o caso não foi para frente na justiça. Assim, ele teria inventado a história da combustão humana espontânea.

Um problema moderno

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Mesmo que a história da combustão humana espontânea seja mais uma lenda urbana e uma superstição, é um assunto que ainda costuma ser muito discutido. O canal de TV britânico BBC disse, em 2010, que Michael Faherty, um irlandês de 76 anos, morreu após seu corpo entrar em combustão e ser reduzido a cinzas. A parte do chão onde seus restos estavam e o teto estavam danificados, mas o restante da casa estava intacta. Apesar dos investigadores forenses verificarem que a lareira da casa de Faherty estava acesa, ela não foi a causa do incêndio.

Ciaran McLoughlin, que foi o responsável pelas investigações do caso, consultou textos médicos, conversou com especialistas e realizou diversas pesquisas. Sem encontrar nenhuma resposta, ele não teve escolha. “Esse fogo foi exaustivamente investigado, e me sobrou à conclusão de que se encaixa na categoria da combustão espontânea humana, a qual não possui uma explicação adequada”, disse McLoughlin, no relatório final.

Fonte: Grunge
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