Na última quinta-feira (18), o mundo da música entrou em choque com a morte de Chris Cornell, vocalista da banda Soundgarden e ex-membro do Audioslave. Tudo indica que Cornell morreu na noite anterior, no seu quarto na cidade de Detroit, após se suicidar.
A esposa de Cornell, Vicky Cornell, divulgou um comunicado, relembrando a memória de seu marido e o pai de seus três filhos, além de apontar a provável causa de sua morte. Segundo Vicky, Cornell pode ter tomado uma dosagem acima do recomendado do Ativan, um medicamento utilizado para aliviar os sintomas da ansiedade. Em uma de suas últimas conversas com o marido, Vicky disse que Cornell parecia “diferente” e que estava “falando arrastado”. E disse a ela que “deve ter tomado uma dose extra ou duas do Ativan.”
Podem levar dias para que os resultados da autópsia e do exame toxicológico de Cornell sejam divulgados. O papel que o Ativan teve em suicídio ainda não está muito claro. Mas qual é a conexão do medicamento com o suicídio? Ele realmente pode levar uma pessoa a óbito?
Entenda abaixo um pouco mais sobre o medicamento.
O que é o Ativan?
O Ativan é o nome comercial do Lorazepam, droga que pertence à classe química benzodiazepina, e que é muito utilizada no tratamento de ansiedade e ataques de pânico. As benzodiazepinas são uma classe de sedativos extremamente viciantes, que possuem “efeitos medicinais muito efetivos”, segundo um especialista. Além de tratar a ansiedade, o Ativan e outras benzodiazepinas, como o Xanax e o Valium, também podem ser utilizados para tratar tonturas e sintomas de abstinência, além de serem úteis para sedarem pacientes que vão fazer intervenções cirúrgicas.
Especialistas em saúde pública não recomendam o medicamento para pessoas que possuem doenças de comportamento viciante, depressão, psicose ou problemas respiratórios.
Como o Ativan afeta seu cérebro?
As benzodiazepinas são depressivos que desaceleram seu sistema nervoso para te deixar mais calmo. Eles agem no ácido gama-aminobutírico (conhecidos como GABA), que está presente nos receptores do cérebro, e são os neurotransmissores mais comuns do nosso sistema nervoso central.
O Ativan é uma medicação antiansiedade de ação rápida, que é prescrito em baixas doses, e costuma ser tomado algumas vezes durante a semana. Quando utilizado corretamente, o medicamento pode “funcionar perfeitamente” para alguém que possui ansiedade severa ou ataques de pânico, disse o doutor Stuart Gitlow, que é ex-presidente de uma organização que trata de medicamentos viciantes. Por exemplo, uma pessoa pode tomar uma dose baixa do Ativan se estiver com ataques de pânico antes de embarcar em um avião. Mas se utilizado de forma indevida, o medicamento possui efeitos similares ao do álcool, disse Gitlow.
O uso prolongado ou abusivo do Ativan pode fazer o paciente “desenvolver uma enorme tolerância”, ao ponto de que o medicamento não fará mais efeito, disse Gitlow. Assim, a pessoa terá aumentar as doses até que o Ativan faça seu efeito original. “Isso significa que após o efeito do medicamento terminar, você ficará mais ansioso, irritável, angustiado e desconfortável”, comentou Gitlow.
Pessoas que tomam doses excessivas do Ativan podem apresentar comportamentos estranhos, tremores e fala arrastada (exatamente o que foi relatado pela esposa de Cornell), entre outros sintomas, de acordo com a Biblioteca Nacional de Medicina dos EUA. E esses efeitos podem se agravar, caso o medicamento seja combinado com outra substância, como o álcool e sedativos a base de barbitúricos.
Qual é a correlação entre o Ativan e o suicídio?
Pesquisas já comprovaram que as benzodiazepinas, como o álcool, podem causar amnésia anterógrada, se uma pessoa ingerir quantidades excessivas da droga. A amnésia anterógrada, também conhecida como “apagão”, é a inabilidade de criar novas memórias, o que significa que o cérebro não consegue recordar eventos futuros. Em outras palavras: é muito tempo perdido.
De forma similar aos apagões alcóolicos, pessoas com amnésia anterógrada, por conta do excesso de benzodiazepinas, podem exibir comportamentos perigosos e desinibidos. Elas podem dirigir de maneira imprudente, cometer crimes e até mesmo tentar se suicidar. “Já vimos muitas pessoas que não possuem comportamentos desse tipo sofrerem as consequências do uso das benzodiazepinas. Pode ser um problema muito sério”, disse o doutor Joseph Lee.
Muitos especialistas alertam que o uso prolongado ou equivocado do Ativan também pode desencadear sentimentos negativos em pessoas com depressão ou histórico de tendências suicidas (Chris Cornell era um dependente químico em recuperação, e já disse que tinha problemas com depressão). E apesar de ser rara, pesquisadores descobriram uma correlação entre o uso equivocado da benzodiazepina e o aumento do risco de suicídio (algo similar já foi notado com a dependência de álcool). Mas também é improvável que o medicamento seja a única causa de um suicídio, pois existem vários fatores que levam uma pessoa a tirar a própria vida, de acordo com o doutor Jeffrey Lieberman, ex-presidente da Associação Americana de Psiquiatria.
Apesar de não ser uma regra, pessoas que tentaram ou morreram por suicídio exibem alguns sinais antes de cometerem o ato, disse Joel Dvoskin, do Departamento de Psiquiatria da Universidade do Arizona. Por exemplo, elas podem dizer que não possuem motivos para viver ou que se sentem como um peso para os outros. Além disso, elas parecem depressivas e com raiva, agem de maneira imprudente, usam drogas e dizem adeus sem qualquer motivo.
O que fazer se você está preocupado em tomar o Ativan
Se você deseja parar de tomar o Ativan, não pare de imediato, pois isso pode ter consequências nocivas e prejudiciais. Sua ansiedade pode piorar, e você pode sofrer uma crise de abstinência, com sintomas que incluem alucinações, convulsões, dores de cabeça e de estômago e problemas para dormir.
“Como o álcool, deixar de utilizar drogas como o Ativan pode ser perigoso e potencialmente mortal. Então parar não é uma opção”, disse Stuart Gitlow.
Gitlow disse que pessoas que desejam parar de tomar o Ativan precisam diminuir sua dosagem aos poucos, com a orientação do médico. Dessa forma, seu corpo terá tempo de ajustar seu funcionamento sem a influência da droga, minimizando os efeitos da abstinência. Mas ele lembra que você deve se sentir um pouco mal por volta de um a dois meses após encerrar o uso do medicamento. “Infelizmente, não há uma maneira de contornar isso”, comentou Gitlow.