O mundo sem sua rede: o que poderia acontecer se a internet acabasse?
Recentes ataques a contas do Gmail trouxeram à tona, não pela primeira vez, questionamentos a respeito da segurança na Internet. Fala-se, novamente, em um possível “Pearl Harbor digital” – uma ameaça invisível e potencialmente devastadora à infraestrutura digital de um país.
Na maioria das vezes, esse tipo de ataque é improvável. Ainda assim, apenas a ideia de considerá-lo possível parece incomodar Bruce Schneier, um notório especialista em segurança. Ele alega que acabar com a internet não é interessante para ninguém. Mas, por um lado, seria mais difícil realizar espionagens sem ela.
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O futurista e escritor Watts Wacker também se preocupa. “Acho que há tanta probabilidade de um ataque cibernético generalizado, se não mais, quanto de se ter algum tipo de ataque biológico ou atômico rudimentar”, afirma. Bruce Schneier respondeu que muitas coisas são possíveis, mas não podemos viver com medo de todas elas. Além disso, ele disse que a internet é facilmente reparável: “Satélites caem, há grandes quedas de energia. Todas essas coisas que o inimigo supostamente pode fazer, acontecem também por acidente. Nós consertamos e apenas seguimos em frente”, disse.
O que aconteceria?
O que incomoda, no fim das contas, é que, por ser improvável um “Pearl Harbor digital”, os governos não estariam preparados na eventualidade dele ocorrer.
Seja por acidente, desastres naturais, ataques terroristas ou vírus, o que aconteceria se milhões de pessoas já nascidas na era da internet (ou plenamente adaptadas a ela) fossem obrigadas a viver como no ano de 1994 por um longo período de tempo, sem solução imediata? O que aconteceria no primeiro dia, na primeira semana, no primeiro mês e depois de que toda a esperança estivesse perdida?
Tobias Buckell, escritor de ficção científica, imaginou um mundo no qual a internet não poderia ser facilmente restabelecida. Veja o que aconteceria, de acordo com as previsões dele:
Imediatamente
E-commerce, e-mail, mensagens instantâneas e chamadas de vídeo ficariam indisponíveis, enquanto calendários e documentos compartilhados pela rede ficariam inacessíveis. A produtividade praticamente acabaria e a vida de quase todo mundo pararia.
Ninguém seria mais afetado do que as pessoas que não apenas necessitam da Internet para trabalhar, mas cujos trabalhos se resumem a ela. Consequentemente, afirma Buckell, profissionais de caráter mais prático, de repente, tornariam-se essenciais.
Primeira semana
As pessoas viajariam para todos os lugares com seus discos rígidos em vez de poderem mandar informações por e-mail ou armazená-las na nuvem. Profissionais que estão sempre na estrada e estudantes usariam esses HDs para armazenar documentos que possam ser compartilhados com um grupo.
Isso não é tão ruim, se considerarmos que, ainda em 2010, as pessoas já carregavam seus pendrives para todo o canto. Peter Jackson é um caso célebre: o diretor cinematográfico sempre carregava um disco rígido com ele enquanto estava filmando “O senhor dos anéis” em uma área mais rural da Nova Zelândia, já que a conexão com a internet era lenta demais para enviar arquivos muito grandes.
Sem internet banking e com a dissolução virtual de empresas de capital aberto, o dinheiro se tornaria a commodity do momento. Com isso, um sistema de troca começaria a surgir nas comunidades locais.
A criminalidade aumentaria consideravelmente à medida que as pessoas passassem a roubar por desespero (não muito diferente dos aumentos dos furtos durante recessões mundiais). Algumas pessoas, porém, reuniriam-se em igrejas e em outros centros comunitários para formar grupos de vigilância.
Empreendedores com bom senso começariam a adquirir novas habilidades e desenvolver novas formas de comércio, porém, a maioria manteria seu dinheiro controlado. Amigos representam pessoas que você pode conviver e não teme uma simples conversa.
Pequenas empresas ficariam de mãos atadas. Empresas maiores, como McDonald’s, dividiriam-se em pequenas corporações, cada qual operando como uma franquia independente – e pedidos da matriz levariam tempo para atingir as várias ramificações da empresa.
Primeiro mês
Dentro de semanas, o que começou como um pânico localizado se espalharia para as relações internacionais. Grupos marginalizados que estavam esperando um momento de fragilidade, enfim, atacariam. Ou seja, o índice de violência aumentaria ainda mais.
Enquanto empresas locais controlariam as grandes corporações multinacionais, surgiriam movimentos locais reivindicando comida. Afinal, a internet ajudou a coordenar a logística de entrega de alimentos em longas distâncias. Mercados abastecidos por pequenos produtores ficariam abarrotados de pessoas e qualquer comida importada que grandes redes de supermercados como Walmart tiverem, se esgotariam em breve. Isso aconteceria só a partir do primeiro mês porque as pessoas poderiam sobreviver com seus estoques de comida por algumas semanas antes que o verdadeiro desespero apareça e antes de que a realocação geográfica dos recursos alimentícios seja uma opção mais urgente.
Os furtos em lojas e supermercados da primeira semana agora se espalhariam de maneira generalizada. Quem pode contar com a ajuda de amigos e familiares ainda iria se manter, mas para várias pessoas, o roubo seria a solução mais rápida.
Sem internet a longo prazo
Após perder toda a esperança de restabelecer a Internet, as pessoas voltariam-se umas contra as outras. Pelo menos é o que prevê Watts Wacker. Sociólogo de formação, ele afirma que os cinco pilares da civilização – o sistema de crença, sistema de fé, modo de vida, meios de comunicação e como tratamos uns aos outros – iriam entrar em colapso sob a pressão de ter que retomar uma era que muitos nem chegaram a conhecer.
Wacker acredita que mesmo uma potência mundial como os Estados Unidos não teria as ferramentas necessárias para responder a uma crise de não-internet. Depois de muitos anos, o homem iria se adaptar e acabaria por criar um sistema de comunicação compatível com a internet. Mas, antes disso, iríamos experimentar uma recessão global sem precedentes.
Sorte a nossa que a perda da internet por um longo período, mesmo que por acidente, seja improvável. “Nós presenciamos alguns ataques cibernéticos bem desagradáveis e nós sobrevivemos a eles,” afirma Bruce Schneier.